Eu bem avisei que certa esquerda se enerva demasiado com Cuba. O
Cruzes Canhoto respondeu-me furiosamente a uma insignificância que deixei aqui em baixo e até um reles «(sic)» serviu à pancadaria.
Verdade que, para atenuar o desforço, o pessoal começa por divagar em torno do conceito de «insulto», julgando que eu me ofendo com facilidade - assim tipo Fidel. Aos poucos, porém, a coisa descamba para o azedo. Renovo os pedidos de calma.
Em primeiro lugar, justifica-se comparar as ditaduras cubana e chilena - apenas na medida em que uma é referência de virtude para a esquerda (mesmo para a esquerda que condena as prisões e execuções), e a outra um modelo de iniquidade sem remissão. Aliás, dizer, insinuar, pensar que Fidel é muito, bastante ou um bocadinho preferível a Pinochet já constitui tecnicamente uma comparação, desculpem lá. Nesta matéria, a direita - que eu, a propósito, não represento - não foi pioneira.
Quanto às estatísticas, apreciei a rapidez, mas, salvo nova gralha, custou-me detectar a prometida superioridade cubana face ao Chile. Isto sem querer ser duplamente chato e perguntar o que fazem os milhares de médicos de Cuba desprovidos de um módico de tecnologia capaz; como se usa a elevada taxa de literacia num país sem liberdade de expressão; que significado têm as percentagens das despesas com educação e saúde se remetem para um PIB quase oito vezes inferior ao chileno (e uma população relativamente similar), etc.
Também não é bonito explicar a ausência de grandes diferenças nestes critérios (nos outros...) com os últimos dez anos de democracia chilena, já que, passe a excepção experimental do dr. Allende, há algumas décadas que o Chile verifica subidas constantes e até notáveis nos diversos índices de desenvolvimento humano - principalmente, não querem lá ver, desde Pinochet. Os dados estão disponíveis na OMS, Unicef e demais sítios do costume.
Por fim, acho estranho que um blogue de esquerda compare regimes ditatoriais com uma democracia, no caso a portuguesa. Além de ser, essa sim, uma equivalência bizarra, é igualmente, e no mínimo, um insulto à memória de (corações ao alto) Abril. Ou um genuíno lamento por Abril não ter gerado uma outra Cuba, mas isso não é comigo.
Sem ressentimentos, caros canhotos. Deixo-vos, em tom descontraído, com o lendário mote de Ernesto Guevara, vulgo o «Che» das bandeirinhas, à época presidente do Banco Nacional de Cuba:
«Tenemos un país para experimentar; nos equivocamos pero seguiremos experimentando, hasta que aprendamos.»
Eu bem avisei que certa esquerda tem paciência de santo. E agora, malta, toca a procurar as gralhas.