quarta-feira, setembro 29, 2004

Van Eyck, van Gogh, vantagens

Este blogue encontra-se em viagem.

O Homem a Dias também não é cultura

Eis (acho) a primeira sugestão de leitura da já longa e iletrada história deste blogue. Para iniciados, é uma delícia.

Rosie Thomas na FNAC de V.N. de Gaia

Felizmente, ela não morreu.

terça-feira, setembro 28, 2004

Dear Heather, poor Lenny

Estive quase a escrever um post longo e fundamentado. De tão triste, o assunto não merece. É só isto: o novo disco de Leonard Cohen, Dear Heather, é um monumento à indigência. O anterior, Ten New Songs, também o era. Cohen anda por aí mas, para efeitos práticos, morreu em 1992 com The Future, que pese o nome era um justo epitáfio. Chega.

Eu sou a Manuela Moura Guedes. E vocês não.

Por descuido ou tara (foi tara), uma pessoa pousa no noticiário da TVI e, em cinco/sete minutos, contempla:

1) M.M.G., a Grande Comentadora, a decretar que “o mundo está farto de Bush”;
2) O pai de uma mulher acusada pela morte da filha a atribuir a culpa ao tabaco e ao café;
3) M.S.T., o Supremo Comentador;
4) A possibilidade de atirar o televisor pela janela;
5) O controlo remoto;
6) Qualquer botão do referido controlo, excepto o “4”;
7) A porta da rua.

quinta-feira, setembro 23, 2004

Saludos amigos

Ao escrever a legenda da fotografia ao lado, reparei que, para manter a coerência face às imagens anteriores, devia acrescentar o nome da região ou do país – no caso, a Espanha. É curioso: vou a Sanabria algumas vezes por ano e nunca me lembro de que fica em Espanha. Quando se está no Nordeste Transmontano, a Espanha não parece ficar em Espanha. O meu pai nasceu a quinhentos metros da fronteira. Vimioso fica a dez minutos dela, a trinta de Zamora. Segundo as crónicas familiares, atravessei-a pela primeira vez com uma semana de idade. Se me apetece ir às compras, vou aos livros em Salamanca como em Matosinhos vou à FNAC do Norteshopping. Se me apetece um passeio antes de almoço, almoço em Ledesma ou em Toro. Em larga medida, aprendi a ler com os álbuns da Disney em castelhano (muito mais substanciais que as revistas da Abril). E, para mim, o Corte Inglés ainda é uma cadeia de comércio exclusiva do lado de lá. Não tenho a noção do lado de lá.
Apesar de tudo isto, o Grupo de Amigos de Olivença continua a enviar-me comunicados oficiais, narrando as respectivas peripécias. Eu tenho-os por gente simpática mas, ó malta, gastar mails nacionalistas comigo é como se a True Love Waits resolvesse distribuir folhetos entre as putas de Monsanto.

terça-feira, setembro 21, 2004

34 anos: nem Cristo, que é Cristo, sabe o que é tê-los

Como é de bom tom, esperei que a populaça se acalmasse para desejar, com a serenidade que a ocasião pede, os maiores e mais requintados parabéns à Charlotte: parabéns!
(Pronto, distraí-me, a data passou-se-me, não estava cá, anda por aí uma gripe. Que é que querem? Nunca vos aconteceu? Desculpa, Carla.)

quarta-feira, setembro 15, 2004

Jukebox

Não é vergonha se disser que só tenho tido ouvidos para o único disco da Goldie Hawn (“Goldie”, 1972), pois não? As canções, de Joni Mitchell a Dylan, são boas, e entre elas inclui-se a fabulosa Pasadena, celebrizada por Al Jolson. Mas, mesmo que não fossem, eu ouviria qualquer coisa que saísse de uma boca próxima daqueles olhos enormes. Confesso: acho a dona Hawn a actriz mais linda que o cinema nos deu nos últimos vinte, trinta, trinta e cinco anos (ela começou – Cactus Flower - quando eu nasci). Ainda por cima, não querendo apregoar discriminações raciais, a moça (que tem a idade da minha mãe) possui óptimos antecedentes genéticos. Ou, como canta o Adam Sandler, Paul Newman’s half Jewish and Goldie Hawn’s half, too/Put them together – what a fine-looking-Jew (embora entradote).

À frente do seu tempo

Em Londres, um homem vestido de Batman sobe as paredes de Buckingham Palace em defesa dos pais divorciados. No Porto, uma dirigente do BE veste-se de dirigente do BE e invade a reunião da Câmara em nome dos desalojados de um bairro.
Folgo em ver que nem toda a política está reduzida ao espectáculo, e que existem debates sérios em curso. Mas por vezes o tempo revela injustiças: na minha infância, havia em Matosinhos um sujeito mais ou menos fantasiado de mariachi que andava pelas ruas a tocar bombo. Hoje, se fosse vivo e alardeasse uma espécie de “causa”, seria considerado um “activista” a ter em conta. À época, era o tolinho, coitadinho, se Deus o levasse...

sexta-feira, setembro 10, 2004

Braindead

Afinal, o medicamento abortivo cuja aplicação a senhora do Women on Waves explicou na tv não só não é muito eficaz (às vezes, o bebé nasce), como pode originar problemas graves (às vezes, o bebé nasce maluco).
Além disso, e com a devida licença, a senhora holandesa choveu no molhado: a julgar pela actuação das associações pró-aborto nas últimas semanas e a idade aparente da dona Andringa, a substância activa misoprostol já deve ser comercializada em Portugal há, pelo menos, uns cinquenta anos.

quinta-feira, setembro 09, 2004

From the gardens...

Com que espírito Sísifo, empoleirado, contemplava a pedra caída no sopé da montanha? Provavelmente com alegria, se comparado com o que eu sinto sempre que regresso de Vimioso. Sobretudo porque, bem vistas as coisas, equilibrar um calhau no pico de um monte também não seria o cúmulo do deleite. Ignoremos as contingências filosóficas, a logística, o castigo e suponhamos que ele cumpria a tarefa: so what? Meia dúzia de telegramas a felicitarem-no e vamos lá a descer que segunda-feira é dia de trabalho. Nada de especial, portanto.
Pelo menos, nada parecido com a beatitude que se colhe no Nordeste, em que a casa é linda, a paisagem é linda, a comida pertence ao ramo da metafísica e os dias são tão magníficos que parecem conter dentro deles dias ainda melhores (a imagem não faz qualquer sentido, mas descontem-me a pieguice – toquem, violinos, toquem).
Pois é, voltei à barbárie. E estou com uma raiva impossível (impossível o tanas). Dou um passo no chiqueiro urbano e lembro-me das caminhadas matinais pelos outeiros. Paro num semáforo e finjo-me naquele rio silencioso, tão silencioso que se ouve baixinho o ocasional Airbus em rota de cruzeiro. Sento-me num restaurante e apetece-me insultar o dono e exigir o javali do Solar Bragançano e o milho doce com puré de castanhas do D. Roberto. Chego a casa e não há maneira de evitar querer estar na minha casa de facto, que não está voltada para a Petrogal nem tem vizinhos a menos de cem metros. Vejo o rosto dos meus vizinhos e quase choro de pensar que nestas férias encontrei uma raposa, dúzias de águias, grosas de rãs, cabritos do Douro e um esquilo, que me saltou à frente num trilho de pastores. Ligo a televisão e, mais rápido que o tempo que demora a dizer-se “telejornal”, evoco as noites mornas no alpendre, com os amigos, o queijo, o vinho, as luzes das aldeias muito ao longe e o céu imenso e iluminado de constelações. E nem me falem da lagoa de Sanabria, ali a norte do Montesinho, onde, apesar dos turistas (como eu, acho), procurando bem sobra sossego e vastidão.
Ai, Sísifo, Sísifo: o que custa é descer o IP4 e carregar a vidinha.