quinta-feira, outubro 28, 2004

Para o Nuno Guerreiro

Mais do que parabéns: muito obrigado.

quarta-feira, outubro 27, 2004

Momento de indignação do dia

Segundo Marcelo explicou à AACS, Paes do Amaral (o corrector do Word insiste em Pães) disse-lhe ser "inaceitável que houvesse uma informação e uma opinião sistematicamente anti-governamental na TVI". Espantoso. Inaudito. Inacreditável. Sinto-me revoltado. Além de cometer erros de concordância, como é que alguém pode achar que a TVI possui informação?

Hã?

A ver se percebo. Há um idiota que come no McDonald’s durante um mês e filma o exercício. Decorridos os trinta dias, o idiota conclui que engordou e que tem um “documentário” de sucesso nas mãos. Outros idiotas pensam nos vastos segmentos de público definitivamente retardados e promovem o “documentário” como um libelo contra a indústria de fast food e, de caminho, a fatal América. Valha-nos Deus. O sr. Moore, pelo menos, recorre a uma complexa (bem, nem tanto) teia de mentiras para corroborar uma espécie de tese. Este sr. Spurlock parte do óbvio e, todo contentinho, chega ao ponto de partida.
Tirando uma equivocada ocasião (em Londres: a “gastronomia” inglesa é capaz de tudo), nunca entrei num McDonald’s. Porque não quero comer daquilo. Mas acho óptimo que milhões de pessoas queiram e comam, e não será necessário um vigarista para informá-las das consequências de uma dieta de hambúrgueres e afins. Engorda? Pois deve engordar. Faz mal? Se calhar faz. Super Size Him? Apetecia-me era aumentar a font do texto para tamanho 72 e perguntar: e depois? Ou, com mais moderação, o que é que o sr. Sherlock tem a ver com isso? Ao contrário do que ele pensa, ninguém ignora os riscos que corre, no McDonald’s ou na vida. Ninguém, excepto os que tomam o produto do sr. Spock pela “denúncia” de outra coisa que não a sua própria estupidez.

PS: Documentário de facto é Capturing the Friedman, que agora saiu em dvd. Mas se a ideia é falarmos da perfeição no género, o Luciano, como sempre, já esgotou o assunto: Wiseman. Nem mais.

sexta-feira, outubro 22, 2004

Ao que nós chegamos

Caríssimo Dr. Miguel Noronha,

Nada de brincadeiras. Que eu saiba, até hoje apenas plagiei uma ou duas piadas do Auberon Waugh e, para perversidades íntimas, os esquemas mentais do Anacleto Louçã. Por isso, compreenderá o meu espanto, quiçá indignação, quando me vejo acusado de copiar o seu pensamento, logo eu, que nem consigo copiar um dvd para o disco duro do computador. Exijo esclarecimentos públicos, não pelo meu bom nome (cruz, credo!), mas por mera curiosidade.

Melhores cumprimentos.

Zelda looks lonely

I

Eu desconfiei que o sr. Merritt era um génio quando ouvi, em estreia pessoal, Reno Dakota:

Reno Dakota there's not an iota of kindness in you
you know you enthrall me and yet you don't call me
it's making me blue
pantone 292

Eu soube que o sr. Merritt era um génio quando confirmei que o pantone 292 era, de facto, uma variedade de azul.

II

À primeira vista, um espectáculo dos Magnetic Fields é um paradoxo. À segunda e terceira vistas, também. Como garante um amigo meu, um espectáculo consiste em “coisas a explodir, automóveis sobre as árvores e gajas nuas em correria”. Ontem, na Aula Magna, não houve exactamente isso: houve um quarteto de ukelele, violoncelo, guitarra/banjo e piano, onde a única movimentação visível era a do braço esquerdo do sr. Merritt, destinada a tapar o ouvido do mesmo lado ao mínimo ameaço de aplausos. Parece pouco? Foi demasiado. Quando, já o concerto ia entradote, os outros três músicos pararam para o sr. Merritt interpretar quase sozinho A Pretty Girl is Like (julgo), com a voz nenhuma que tem e com a técnica de instrumentista que não possui, revelou-se o que devia ser óbvio: aquelas canções são tão boas que se pode despi-las, até desfolhá-las como o Paulo de Carvalho fez à moça que viera em flor nos idos de 1974, e, ainda assim, elas resistem sem um espirro. O único problema do desgraçadamente prodigioso songbook do sr. Merritt é suscitar uma vontade quase irreprimível de atirarmos pela janela fora toda a pop anglo-saxónica dos últimos quarenta anos, e só pararmos em Brian Wilson e Phil Spector, os últimos a fazer e produzir canções comparáveis. Estes atafulhavam-nas com o que podiam; ao vivo (digamos), o sr. Merritt tira-lhes tudo e deixa um fio, o suficiente para que se lhes ouça dez segundos e se diga, maravilhado: que maravilha. Faltou alguma coisa? Não querendo passar por ganancioso, eu teria apreciado uma Zebra.

III

E um imprescindível "obrigado" ao Ricardo, o melhor anfitrião de Lisboa, um sábio e um amigo. Mais: o Ricardo contemplou o concerto da primeira fila porque mereceu, ao contrário de outros que me recuso nomear (este e este), os quais, entretidos a discutir as respectivas alturas, se desleixaram a ponto de só conseguirem bilhetes para as berças. E depois eles mal viram o espectáculo e ninguém os viu a eles.

domingo, outubro 17, 2004

Au-delà des apparences

Caro Américo: nem mimos nem polémica. A consideração que o Luis me merece e a irrelevância do Derrida na minha vida não me deixariam inverter os valores que importam e, digamos, desconstruir o essencial. Além do mais, até acho que o Luís tem certa razão: o post sobre o Grand Jacques era uma graçola assim a dar para o “correcto” (ou um “texto da moda”, como ele prefere). Mas, convenhamos, antes isso que concordar com o Eduardo Prado Coelho: já me custa o suficiente evocar o Heisenberg.

PS: E agradeço a sugestão do restaurante. Sabe, Américo, a verdade (se a verdade podesse ser enunciada) é que eu já não vou à Bairrada há demasiado tempo.

quinta-feira, outubro 14, 2004

Educação física

O Luís Carmelo desagradou-se com um post meu sobre Derrida. O Luís Carmelo tem o direito de abominar o que lhe apetecer. Eu também. Apenas gostaria de esclarecer o seguinte: foi Heisenberg, e não Derrida, quem, grosso modo, nos “deu a ver que as coisas (e os homens, mesmo se a dias) estão sempre em movimento e em postura incertos”. E, facto um nadinha irónico mas não desprezível, o móbil do físico era a clareza. A clareza, imagine-se.

Uma casa em Bagdad

Quando conheço pessoas que, até então, só respeitava e admirava à distância, nunca receio abalar a imagem que tenho delas. O problema é a imagem que elas pudessem ter de mim. Um exemplo? Cem anos que viva, não esquecerei o olhar do Luciano Amaral, algures entre o espanto e o horror (mas não muito longe de nenhum dos sentimentos), ao ver-me acompanhar o bacalhau assado com arroz. É: arroz. Não gosto de batatas, e a aberração gastronómica é apenas um buraquinho no bombardeado edifício que dá ao Homem a Dias um trabalho dos diabos para retocar e esconder.

segunda-feira, outubro 11, 2004

Um dia negro para a indecidibilidade

Ontem, morreu Derrida. Ou talvez anteontem, não sei. Numa página panegírica, o "Público" lembra o legado do "pai do desconstrutivismo", da “diferença”, da "indecidibilidade" e de inúmeros outros conceitos, todos obedientes ao conceito basilar da "incompreensão". Para testemunhar a importância do filósofo, foram chamados Eduardo Prado Coelho e Manuel Maria Carrilho, nomes que por si só legitimam o lugar do francês no pensamento contemporâneo.
Mas também se evocaram os pormenores pitorescos, como a recusa de Derrida em ser fotografado ou filmado, que durou até à década de 70. Ao que parece, ele acreditava genuinamente que as câmaras podiam roubar-lhe a alma ou a carteira, dependendo do utilizador. Quando, aí por 1972, o informaram da imbecilidade da tese, ele passou a autorizar retratos 3x4 e desenvolveu em dez minutos um complexo edifício teórico, no qual demonstrava que um filme era mais movimentado que a imagem estática, e que ambos podiam ser vistos de pé.
Há menos de um ano, veio a Coimbra receber o doutoramento "honoris causa" e aproveitou para criar 25 novos conceitos, só no comboio para a Mealhada. No regresso, provou com uma simples des(pres)suposição da não-inércia co-tangente à imaterialidade da/na linguagem mí(s)tica que o Meta dos Leitões serve bem e em conta.
Além de activista político, foi um estudioso voraz de geometria, física e matemática, pormenor notável numa pessoa que nunca chegou a perceber qualquer dessas ciências.
Mais notável ainda é que Derrida partiu sem se sentir incompreendido. A falta que semelhante homem nos fará apenas pode definir-se através de um conceito que ele, infelizmente, se esqueceu de criar.

sexta-feira, outubro 08, 2004

Já é oficial

Eu também saio da TVI (aliás, faço-o todos os dias e sem custar nada, sempre que o zapping me leva ao engano).

quinta-feira, outubro 07, 2004

Notas de viagem

Está bem. Amesterdão é um bocadinho mais organizada e bonita que a cidade portuguesa média. Uma mão de Rembrandt vale toda a história da pintura (?) nacional. Os cinco ou seis pisos do American Book Center envergonham trinta FNACs juntas. E, de manhã cedo, num café pequenino junto ao Prinsengracht ouve-se a Stabat Mater, do Brunetti.
Mas farejei como um perdigueiro os restaurantes tailandeses, gregos, indonésios recomendados pelo Eyewitness e posso assegurar que a comida holandesa é uma merda, mesmo sem a compararmos a um arroz de javali que eu cá sei. Além disso, a sinagoga local chama-se Portuguesa e o tenor do Stabat Mater Luíz Alves da Silva. Não há como a nossa terrinha.

quarta-feira, outubro 06, 2004

E este Marcelo, também vai para a Madeira?

Houve algum golpe de Estado na minha ausência? E nos blogues, ainda se pode escrever? Ainda há blogues?
Por via das dúvidas, deixo aqui lavrado que não tenho nem nunca tive qualquer ódio pelo Senhor Doutor Santana Lopes. Mais afirmo que acho o Senhor Doutor Santana Lopes uma figura de excelsa valia, e um exemplo a seguir por todos os patriotas dignos, ou indignos, desse nome. Eu gosto, não, eu amo, não, eu venero de modo incondicional o Senhor Doutor Santana Lopes e não sei de facto o que seria a minha vida sem a sublime existência dele. Juro por tudo quanto é sagrado, incluindo a Alta Autoridade para a Comunicação Social, a TVI e aquele portentoso rapaz do divino PSD que se chama Gomes de Não Sei Quê e pelo qual eu nutro igualmente um desmedido respeito.
(E depois é um disparate lamentar-se a demissão do prof. Marcelo. Quando calaram o outro Marcelo, o pessoal saiu à rua e a pândega durou meses. Embora aí? O champanhe não é por minha conta.)

PS: Se quisermos outra versão conspirativa, também não custa admitir que o prof. Marcelo aproveitou o delírio de um ministro para se demitir e criar uma pequena tempestade. Ao exercício podemos chamar vingança. É compreensível e muito mais interessante que os sermões de domingo.